Por que Libra é a queda do Sol (e sua exaltação é Áries)?
O zodíaco apresenta uma história que pode ser contada de diversas formas a depender de qual fio narrativo você escolhe priorizar: o fio das estações, dos aspectos, das imagens, das regências entre outros. Seja qual for, esses diferentes caminhos exegéticos devem levar ao mesmo resultado para que a astrologia mantenha seu caráter de conhecimento hermético. Assim, para demonstrar porque Libra é o signo de queda do Sol, vou eleger alguns desses fios condutores para tecer a linha de raciocínio.
Os signos do zodíaco estão relacionados às estações do ano com base no Hemisfério Norte. Este é apenas um ponto de referência para a construção do conjunto simbólico que forma parte da astrologia e, por isso, não invertemos as relações no Hemisfério Sul e nem nos preocupamos com a diversidade climatológica ao redor do globo, com todas as nuances de polo a polo (porque, a bem dizer, os climas em ambos os hemisférios são muito mais complexos do que dizer que "verão é quente e seco" ou "primavera é quente e úmida", por exemplo). Não esqueçamos que a Astrologia recebe, em sua formação, influência de filosofias como o platonismo, para quem o mundo das ideias possui formas perfeitas que vão se manifestar “imperfeitamente” no mundo dos sentidos. Em resumo, o que fale aqui é ter um modelo comum para garanta a orientação consistente do processo analítico. Assim como posso ler a carta do Papa do Tarot para um consulente não-católico, posso ler o signo de Capricórnio como o início do inverno para alguém que tenha nascido no sul do planeta e as considerações serão igualmente válidas. Por essa razão, e para que as pessoas se desapeguem um pouco da necessidade cartesiana que não cabe ao fazer oracular, costumamos chamar as estações astrológicas de estações míticas (Capricórnio, por exemplo, inicia o inverno mítico) a fim de diferenciá-las das estações "geográficas".
Tendo entendido isso, sigamos. Áries é o primeiro signo do zodíaco e o início da primavera mítica, responsável por vencer o frio e a escuridão do inverno e dar start a uma fase em que, aos poucos, os dias vão ficando mais longos do que a noite e o calor prevalece. Neste sentido, o Sol - astro da luz e da unidade, dado ao seu caráter único e diferencial de ser o fornecedor de brilho e calor próprios - exalta-se em Áries, o pioneiro por excelência, aquele que faz a vida triunfar quando imprime intensa energia no mundo para fazer os animais saírem do estado de hibernação e inatividade, as árvores florescerem suas copas e os humanos revigorarem seu espírito. O Sol em Áries é a vitória da presença sobre a ausência, da visibilidade sobre o apagamento, da vida sobre a morte e da realização sobre o recolhimento. Não que essas outras características - ausência, apagamento, morte e recolhimento - não sejam boas e desejáveis em nenhum momento, mas aqui estamos falando de um movimento cíclico em que, quando algo atinge seu ápice, logo em seguida começar a ruir para dar espaço às demais coisas.
Quando chega em Libra, signo oposto a Áries, o Sol cruza novamente o equador celeste, desta vez inaugurando um período no qual, a cada dia, a escuridão e o frio vão se impondo sobre a luz e o calor, um anúncio do inverno que se reaproxima e da vitória das forças da morte. Saturno se exalta em Libra, onde o Sol tem queda; assim como Saturno tem queda em Áries, onde o Sol se exalta: Sol (luz) e Saturno (trevas) são inimigos naturais. O Sol, esta estrela de fogo eterno, indivisível e coeso, vê-se obrigado a se bifurcar nos braços da balança de Libra, que questiona seu poder e sua essência. O Sol, que tanto gosta de certezas (com as quais se afirma no mundo), passa a duvidar de sua força e integridade, perdendo a coroa de rei e fazendo do outro o espelho que vai ajudá-lo nessa busca pelo autorreconhecimento e segurança. A autossuficiência solar acaba aqui e nasce, portanto, a dependência. Como sempre digo, Libra - signo cardinal de polaridade positiva - é extremamente ativo ao seu modo, mas como o Sol em Libra nele se encontra debilitado, temos, para este símbolo em específico, uma ação frustrada pelo medo, incerteza e desvalorização.
Foto: Milada Vigerova
Esse processo, do ponto de vista do desenvolvimento da própria consciência, é importante para entendermos os limites (Libra/Saturno) do nosso EU (Sol), que precisa se ver derrotado para não se entender como absoluto. O processo é sofrido, pois demora até o Sol em Libra recompor suas partes e se desapegar de aparências e preocupações com a reputação para reabrigar a sua verdade, com a qual brilhará naturalmente pelo infinito. O fato de Libra ser regido pela Vênus que, ao contrário de Saturno, não é inimiga do Sol (talvez apenas um desafio a ele), mostra que o caminho do amor é o único possível para resistir à extinção da fagulha que nos mantém vivos e indeléveis. Mais do que isso, a Vênus nos recorda da Beleza socrática, em que o reconhecimento do BELO não nos dá uma necessidade vaidosa de posse ou da aprovação, mas de saudade sobre nossa origem divina. Encontramo-nos quando vemos a beleza em nós, afinal, somos feitos "à imagem e semelhança de Deus."
Guilherme de Carli
@nodonorteastrologia